Florentina de Melo Silva, 60 anos, é neta de Henriqueta Melo, referência na religião de matriz africana. Desde cedo, Florentina vivenciou experiências espirituais marcantes. Aos sete anos, durante uma mina, sentiu a visão turvar e, ao som distante dos tambores, desmaiou. Quando acordou, pela manhã, estava cercada de pessoas, entre elas sua avó, que lhe disse que ainda era pequena para assumir responsabilidades espirituais. Para protegê-la, realizaram uma segurança, adiando assim seu caminho religioso.

Aos oito anos, Florentina mudou-se para Belém, onde viveu com uma família. Com o passar dos anos, começou a enfrentar fortes dores de cabeça, episódios de perda de consciência e momentos em que se sentia desorientada, precisando ser amparada pelas pessoas ao redor. Foi então que, em uma dessas situações, seu avô Lodigero apareceu e a aconselhou a retornar para cumprir sua missão espiritual. Já aos 24 anos, buscou sua avó Henriqueta, que a orientou sobre a necessidade de realizar seu encruzamento, momento que marcou o início de suas responsabilidades religiosas.

A partir daí, Florentina se dedicou integralmente à religião de matriz africana. Durante décadas, trabalhou com ervas, folhas, sementes e raízes, sempre consciente da importância de preservar a tradição deixada pelos ancestrais. Para ela, manter viva a cultura é também uma forma de resistência, sobretudo diante dos preconceitos que ainda persistem contra as religiões de matriz africana.

Hoje, aos 60 anos, Florentina carrega a responsabilidade de dar continuidade ao legado da família. Seu desejo é um dia passar o bastão para alguém de sua linhagem, garantindo que a tradição não se perca e que o amor e a fé sigam sendo transmitidos. Para ela, a cultura deve ser compartilhada de geração em geração, com respeito e união: “Fé é amor e amor é cultura. É dando que se recebe, ensinando e sendo ensinado, para que possamos caminhar dignamente”.